Paúla

“O Espírito Santo acaba por ser aquela entidade que nos dá aquela força, aqueles dons (...) e se tivermos fé acreditamos que é através dele que conseguimos (…) levar a nossa vida da melhor forma” (Sandra Pintéus, 2022).[1]

 

O testemunho do Senhor Armando, já falecido, mas lembrado pela população como “o guardião da Capela” de Paúla, é várias vezes mencionado para evocar as antigas práticas da comunidade local relacionadas com o culto do Espírito Santo. Na época de seu pai, a Capela de Nossa Senhora do Ó ainda seria denominada de Capela do Espírito Santo.[2] Também um documento entretanto encontrado nas finanças e onde o artigo da Igreja aparece como “Fábrica da Capela do Espírito Santo” é referido como um dos argumentos que incentivaram a comunidade da Paúla a associar-se a outras localidades do concelho e organizar, na sua aldeia, os festejos do Divino Espírito Santo de Alenquer.

Para Sandra Pintéus (2022), envolvida na dinamização das comemorações em Paúla, houve um motivo ainda mais importante: a fé e a devoção. “Se uma pessoa tem fé e é devota (…) faz todo o sentido dedicar estes festejos ao Espírito Santo, à terceira pessoa da Santíssima Trindade”.

Sobre as festas, Sandra Pintéus explica que uma semana antes do domingo das celebrações, a população fixa pela aldeia bandeiras que produziu especificamente para esta ocasião, alusivas ao Espírito Santo e adornadas com o símbolo da pomba. Refere que o embelezamento das ruas faz-se apenas com uma semana de antecedência “para não se confundir” o calendário das festas, pois há celebrações a decorrer noutras localidades do concelho. Cada comunidade “tem o seu domingo” para comemorar o Espírito Santo, e com a decoração das ruas fica-se a saber que, naquele fim de semana, realizar-se-ão os festejos na Paúla. Sandra esclarece ainda que esta é uma tarefa partilhada entre homens e mulheres, mas “são os homens que sobem aos escadotes” e afixam as bandeiras nos locais mais altos, chegando por vezes a usar empilhadores.

Na semana de preparativos, o Coro local faz vários ensaios dos cânticos que irão fazer parte da liturgia de domingo.

Com mais antecedência, pelo menos quinze dias antes, afixam-se nas lojas e cafés da aldeia pequenos cartazes a solicitar contributos para o bodo − ingredientes para a confeção da sopa ou alimentos variados, como salgados, doces, bebidas e o que mais a população quiser ou puder dar. Sandra explica que mesmo sendo a organização a fazer a sopa, muitas vezes os ingredientes são doados por indivíduos, famílias ou instituições locais.

 

Bênção no final da Procissão do Espírito Santo em Paúla (2022)

 

No domingo dos festejos,[3] a missa é totalmente dedicada ao Espírito Santo, com uma homilia sobre os “dons” do Espírito Santo – a sabedoria, a inteligência, o conselho, a fortaleza, a ciência, a piedade e o temor de Deus. De referir que a comunidade cristã da Paúla expõe, no altar durante a eucaristia, quadros alusivos a esses “dons” que são depois transportados por crianças na procissão.

Na procissão, depois do gaiteiro,[4] desfilam as insígnias do Espírito Santo, o estandarte e a coroa da Paúla. Sandra Pintéus refere que só adquiriram as insígnias depois da revitalização dos festejos no concelho. No primeiro ano organizaram as celebrações com insígnias emprestadas pela Câmara Municipal. No segundo ano adquiriram o pendão e no quarto compraram a coroa. Na procissão estão também presentes as bandeiras da Junta de Freguesia, da Coletividade e de Irmandades convidadas.

A procissão é curta. Os crentes saem da Capela do Espírito Santo, passam pela Coletividade, vão até ao largo da Rua do Comércio e voltam de novo para a Capela, onde, na entrada, a coroa, o estandarte e as pessoas são abençoadas, terminando aí a cerimónia religiosa. “Logo no primeiro ano decidimos que seria só na rua principal (…). Nem chega a uma hora (…), mas é o suficiente para assinalar o dia aqui na aldeia”, conclui Sandra.[5]

O bodo é oferecido na Coletividade. Quando os participantes chegam ao local já está tudo preparado, longas mesas com diversas iguarias alimentares – a sopa, tremoços, azeitonas, pão, carne assada, doces, salgados, vinho e outras bebidas. A sopa da Paúla leva feijão, carne de porco e vaca, toucinho, chouriço, batatas, couve, azeite e temperos. O pároco benze o bodo e começa o convívio e animação, com a atuação ou de um Rancho Folclórico convidado, ou do Grupo de Cantares da Paúla.

No fim de semana do Pentecostes, representantes da festa da Paúla costumam ir ao encerramento das celebrações em Alenquer, participando na procissão com a coroa e o estandarte e ficando depois para o grande bodo.

 



[1] Em entrevista realizada no âmbito desta pesquisa, em representação da comunidade de Paúla.
[2] Segundo a lenda, depois de D. Afonso Henriques ter conquistado Santarém, na sua viagem a Lisboa, terá passado por aquela localidade e mandado construir a Capela, daí a placa que se encontra no alpendre de entrada com a inscrição: "Erigida em 1147". Sendo, por isso, considerada uma das Capelas mais antigas do concelho de Alenquer.
[3] Que em 2022 aconteceram no dia 29 de maio à tarde.
[4] Em 2022, o gaiteiro Tiago Morais.
[5] Antes de seguirem para o bodo, a Câmara Municipal oferece um concerto musical que acontece ainda dentro da Igreja. Em 2022 atuou Paulo Amorim com guitarra clássica.